Falando de amor, ainda (?)

PARA QUEM GOSTA DE LER INDAGAÇÕES: (puramente patológico)

Salvador DALI, Vénus de Milo aux tiroirs, 1936.

Andei por alguns blogs na semana passada, coincidentemente ou não, o amor estava no ar - literalmente. Fiquei martelando a tal pergunta, “o que é o amor?”. A blogosfera até publicou um livro, tamanha a complexidade do tema - que nunca teve definição ao pé da letra, em solo terrestre. Possivelmente no mundo virtual "ele" tenha um sentido menos abstrato e talvez até tangível. Será? Preciso ler pra crer. Sinceramente, penso que seja melhor deixar sem resposta, não é bom mexer com quem está quieto. Mas, como a questão incomoda, me atrevo. P’ra traduzir o amor basta senti-lo, é a minha concepção principal – não tenho outro argumento plausível. Acredito que cada um tenha sua própria interpretação, o que é melhor ainda.
Com todo respeito ao conterrâneo Buarque de Holanda*, faço pequenas e oníricas analogias. Segundo o mestre: 1- Sentimento que predispõe alguém a desejar o bem de outrem. No meu caso, isso seria o amor geral, a paz no mundo, aos homens de boa vontade e aos mal intencionados também, afinal são gente. Ressalto que ele* não classifica o amor de bicho – falta grave – quando eu chegar a ABL vou levantar a questão. 2 – Sentimento de dedicação absoluta de um ser a outro, ou a uma coisa. Eu acho que é meio mistura de amor de coisa e amor de gente. 3 – Inclinação ditada por laços de família. E 5 – Afeição, amizade, simpatia. É o mais natural, o amor de gente. 4- Inclinação sexual forte por pessoa doutro sexo. Aqui a coisa complica, é o amor dos sexos (opostos ou não, vale dizer, Sr. Aurélio*). 6- O objeto do amor (1 a 5). Eu diria que se o amor tem um objeto, esse seria eu (e os outros sensíveis e românticos). Como sou toda sentidos, experimentei de todos: O TIPO UM, teve seu momento mais crítico quando "freqüentei" a Faculdade de Veterinária ou foi quando me apelidaram de Felícia? Fiz minha carterinha do Greenpeace. Votei pelo desarmamento... Hum, sou boazinha, tá pensando o quê? TIPO DOIS: eu olho para os meus livros mais caros – é um apego sem precedentes. Outro amor sem limites que tenho desde muito criança: meus bolachões com bandas paleolíticas - d'uma época que havia música de verdade e eu nem era nascida. Meus anéis de coco e as pulseiras de sementes, amo - adoro. Tenho um tênis velho que é o meu amor. O meu amor platônico mesmo é a minha cama, jamais sento nela com roupa suja e nem deixo que o façam – isso é coisa de velha (psicológica) mesmo. Após o ritual sagrado de um banho, sim. Apenas cheirosa e com vestes limpas opero meu precioso sono. Assumo publicamente que meu maior problema no casamento, não será dividir a vida, mas, repartir a minha caminha (grandona e só minha). Sinto que nem ela quer isso, ainda mais todos os dias. Ela tem consciência de quando (o TIPO QUATRO, começa por aqui) vira palco para apresentação de algum espetáculo amoroso, durante o ato até esqueço dela, mas sei que existe, está presente e participa. Mas assim que se fecham as cortinas, após o aplauso final, se não houver pedido de bis, canja do artista, tampouco sessão extra às cinco da manhã - minha favorita. A manhã seguinte é tempo limite para purificá-la, limpo seu tablado, visto-lhe com novo cenário e digo-lhe que fique bem, pois logo estarei em casa. Voltando às classificações, os TIPOS TRÊS E CINCO, são os triviais: Amo papai, mamãe, irmãozinhos, etc. Amo todos meus amigos virtuais ou não. Amo você também. Ai! Matéria fraca e cheia de apegos. Ah! Mas é bom demais esta envolvida com esses tipos todos. Do quê que estou falando mesmo? Ah! Do amor. Numa maior explanação do TIPO QUATRO: Engraçado, sinto amor nos braços, nas pernas, na boca, na língua... Onde quer que me toque. Quando ele se espalha internamente, noutras vísceras, sinto todo o peristaltismo do organismo, até quando o amor vai chegando ao coração é possível pressentir. O estágio fatal é quando se alastra na massa cinzenta - bem no começo dos seus efeitos colaterais, quando tende a paixão. Se ele escorre por fora, as mucosas umedecem, as orelhas ficam quentes e o tecido epitelial fica igual aos dos frangos depenados. As mulheres sempre confundem sexo com amor, afinal o delas pulsa semelhante, no caso, voluntariamente. Elas têm dois corações, assim como os homens têm duas cabeças e às vezes as idéias da mais próxima ao solo prevalecem sobre a que vai nas alturas. Não há confusão, nem complexidade nas mulheres, algumas vezes elas conseguem amar apenas com o coração de baixo, mas é coisa rara. Lamentavelmente ou não. A vida não é filme, mas imita a arte e vice e versa, como nos escritos clássicos o amor pode tudo, desde escravizar até os últimos dias de vida, como “nos tempos do cólera” ou mesmo matar Julietas e Romeus. Mas isso aqui é verborragia, meus devaneios não são tão sérios ou dignos de créditos. Aos que lerem, com a ilustração de Dali, justifico esse conceito, que já passou por muitas cabeças. Será? Bem, acho que nosso corpo, como um arquivo tem suas gavetas, nelas abriga uma infinidade de sensações – em saches perfumados com doses específicas de amor. Cada gaveta destinada a um ser ou a alguma coisa. Há os que deixam as gavetas abertas, realmente não guardam nada. Tem gente que se guarda aos pedaços, tamanho o medo que o amor vaze e seu aroma deixe rastro. E há aqueles que fazem bagunça, esquecem do que guardou aonde. Mesmo com a possibilidade de criar um arquivo devidamente organizado, a falta de tempo e a pouca disponibilidade de ouvir a si, não permite uma catalogação adequada. Por vezes perfumamos demais algumas gavetas, noutras esquecemos de colocar a essência. Nesse momento se constata que para alguns o amor é problema, algo como nascer com alguma limitação psicológica – no caso das mulheres ou física* – no caso dos homens.
Tenho um amigo que tem um problema sanguíneo, que faz o coração dele aumentar de tamanho, ele sabe que viverá pouco. Com a autorização dos médicos, lota seu coração de amores (paralelos, intercalados, simultâneos, etc.) e ainda diz que sempre cabe mais um. Vive amando, sobre tudo a ele. Pois seu coração não pára de crescer. Não importa, “estou falando de amor e não das suas doenças”, não é mesmo? É que eu, apesar de gostar, também tenho um medo danado dessa coisa que é o amor. É uma febre que sempre me derruba. E olha que até me escondo, uso disfarces, desligo o telefone, fico offline. Mas ele é onipresente. Assustador e não deixa de ser belo. Fabuloso até, principalmente quando expele suas lavas, suas nuvens encobrem os olhos e seu fogo carboniza a mente. Por isso tento mantê-lo na reta final da linha alba. Apenas para apreciar. De lá é mais fácil ver as suas desembocaduras e sair correndo antes que ele inicie seus abalos sísmicos.

Nenhum comentário: