Eu?

Quando me pergunto o que sou. De soul, gosto muito. Suei tanto, que perdi o rumo. Gosto de soar como um surdo descompassado em qualquer roda de samba. Sambei, sambei, sambei que desaprendi dançar. Agora nem falsa baiana, nem acrobata de trance. Sou um ponto de interrogação (pra mim), em caixa alta, arial black. Uma linha pontilhada. O vão entre as aspas. Um "i" maiúsculo e ponto. O contrário de ontem ou o oposto de amanhã, gostaria de ser. Gosto de me arrepender dos atos impensados, para ter do que reclamar na rotina. A simplicidade me sufoca e a grandeza me irrita (minha ou dos outros), não suporto os perfeitos. Não gosto de rimas, não procuro por elas, não combino com elas. Sou péssima para jingle. Gosto das palavras soltas ou escritas, da maneira como completam o branco das páginas e da vida. Meu nome grande, espera feitos relativos. Me aborrece minha vergonha desavergonhada na intimidade, por pudor prefiro ser impura. Me emputece o fator de proteção solar não contemplar os vinte e nove anos, ainda não tenho trinta, faltam doze meses. Só sei contar estórias, números são sinais exatos, medidas precisas, odeio cálculos e mais ainda os sinais do tempo. Creme anti-sinais uma ova, não há tecnologia que estique as rugas da alma, mas, por via das dúvidas passo na cara. Morri tantas vezes de raiva das curvas que me envelheceram aos onze, que debocho da vida hoje. Tive a bunda achatada pelas oito horas diárias de trabalho esforçado, antes mesmo de acrescentar as outras quatro tardias na carteira da academia, quase rimou. Os seios fartos são a única certeza dos filhos fortes, que ainda não tive (se os tiver minha mãe saberá criá-los, como fez a mim. Não quero a dor vê-los voar para longe como fiz) e também da futura dor de coluna, como pesam quando ovulo. Amei um advogado, paguei os pecados que colecionava. Coleciono (secretamente) todo tipo de "ex", sou chegada na melancolia, apenas a minha ex-coleção joguei fora, simbolizava os "por poucos" e "quases" êxitos amorosos, aparentava mal nas rodinhas de fofoca das minhas ex-melhores amigas, casadas, gordas, cheias de filhos, varizes, celulites e estrias - não que, não tenha o que me farte, só me falta tempo para queixas. Odeio a falta de assunto das donas de casa mal comidas. Abomino chocolate. Adoro doce-de-leite talhado, quente ainda. Como de tudo um pouco e repito. Não fumo mais - nada. Nem pulo carnaval. Não que, não acredite em deus, apenas tenho minhas dúvidas, estou à disposição se ele desejar me explicar o mistério da fé (a minha é abalada constantemente pelos os de pouca). Meu vício, paixões platônicas e coca cola normal, claro. Repito roupas que gosto. Não gosto de andar com os pés no chão. Aprecio o bom gosto, mas sou brega, gosto de rock and roll dos anos setenta. Gosto de garotos descabelados, dos que usam all star sujo, desde que não sujem minha cama (sagrada, altar do amor meu, meu berço). Vivo em círculos, mas tenho planos para o futuro. No meu aniversário gosto de falar (ainda mais) de mim, fica mais sincero do que as frases feitas dos cartões baratos que não ganho há tempos. Falo muito e consigo dizer absolutamente nada. É isso.

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